segunda-feira, 9 de janeiro de 2017

Diário de um Psiquiatra: Rehab

“Luzes se misturam... uma escuridão que se dissolve entre luzes que invariavelmente se misturam... como um borrão...”

(...) Uma longa e intensa respiração, como se fosse a última, me domina e me traz à vida. Uma pequena morte domina meu paladar com um gosto incontestavelmente sombrio. Sinto arder os lábios e levo mecanicamente aos mãos a eles, em uma visão nublada vejo meus punhos marcados de sangue, sinais de luta? Deixo a falta de força nos braços falar por mim e os atiro inertes sobre os travesseiros do que parece ser o sofá de meu escritório... como vim parar aqui? Isso não precisa importar agora. Fecho os olhos na esperança de que minha visão se estabilize, o peso característico de meus pensamentos evidenciam experimentação de bebidas, drogas e muito cigarro, nada fora do habitual, do vigente habitual. Percebo que de olhos fechados o mundo gira desconfortavelmente e os abro como se pudesse me perder no limpo para sempre se os mantivesse fechado por mais um segundo, vislumbro uma claridade quase mortal e meu corpo reage como que ele todo quisesse se mover para dentro a procura de uma escuridão qualquer, instintivamente meus braços se movem esbarrando em papeis, agarro os e fecho os olhos respirando como quem se recupera de um choque, lembro de técnicas de meditação, limpo meus pensamentos e observo meu respirar até que me acalmo. Com cautela, abro os olhos, semicerrados, me adaptando à luz, mantendo-me assim pelo tempo que me pareceu horas percebo que ainda prendia entre meus dedos papeis e os levo à face, em meio à uma perspectiva ainda turva noto que se trata de minhas anotações e quando vejo de qual paciente se trata, noto que era justamente o último de minha carreira. Há anos não nos falamos, desde que indiquei alta medicamentosa acompanhada por psicólogos. Tomado por pensamentos cedo novamente à resistência de manter os braços suspensos e novamente inerte, fecho os olhos, me vendo como era, da penumbra desse escritório, sentado na onipotência de minha poltrona, alheio, protegido por um diploma, imune aos devaneios de meus pacientes... não eram realidades tão distintas a minha e a de meus pacientes?




Depoimento de um esquizofrênico: Auto-penitências

Há meses preso nesse ciclo, talvez não merecia tanta confiança dada pelo meu especialista... não consigo lidar com a pressão dessa vida, co...